Archive for 05/08/12

Rogério Flausino cansou de ser achincalhado. Em entrevista, o mais novo quarentão do pop rock brasileiro não economizou nos palavrões, nos desabafos e repassou os 15 anos de hits e mágoas do Jota Quest. Após sete CDs, três DVDs e 4,5 milhões de cópias vendidas, o quinteto lança "Folia e caos". O novo disco tem duas horas de música e convidados como Maria Gadú, Nando Reis, Erasmo Carlos e Humberto Gessinger (ex-Engenheiros do Hawaii), que mandou uma letra inédita por SMS para Flausino.

Como foi a parceria com o Humberto Gessinger?
Rogério Flausino –
O Humberto foi um dos nossos convidados em Porto Alegre. Batemos um papo ótimo, nunca tínhamos conversado antes. Ele é um cara muito perspicaz. Falamos muito da vida. Eu disse que era fã e pedi uma letra. Falei que ele deveria ter algo guardado, sei lá. No dia seguinte, acordei cedinho. Liguei o telefone e ele tinha mandado uma letra por SMS. Peguei o violão e "pá-pum": saiu "Tudo está parado". Das quatro novas, essa é que eu mais gosto.

Por que ‘Folia e caos’ como nome do disco?
Rogério Flausino –
"Vivendo de folia e caos" é a primeira frase da música "Na Moral". "Folia e caos" é porque foi uma zona, um carnaval. A comemoração foi boa porque nos proporcionou uma descontração que há muito tempo a gente não sentia. Estava pragmático, careta, paradão. Estava um momento estranho na música, sem clima para gravar um disco de inéditas. 

Qual 'momento estranho'?
Rogério Flausino –
Quando a venda do CD diminuiu 80%, foi grotesco, um golpe duro no pop rock e na MPB. Eles dependem do investimento das grandes companhias para sobreviver. As bandas da década de 80 mudaram a cabeça da geração. Depois veio a década de 90, fizemos parte daquilo. Todo mundo trabalhou para caramba. Havia um investimento e quem soube aproveitar chegou até aqui. Nos anos 2000, tivemos a Pitty, Los Hermanos. Se comparar em números, agora é muito pequeno. Há bandas caminhando no underground, mas tudo na periferia da coisa. Existe público, mas sem investimento. As bandas ainda não ganharam o grande público.

Por isso que bandas novas de rock não conseguiram o sucesso da sua geração?
Rogério Flausino –
Isso é uma merda. Começamos a nos sentir oprimidos, o segmento está oprimido. Os outros estilos no Brasil conseguiram se organizar, e a coisa é cavalar. Gravar o quê e por quê? Rola uma pressão. Pressão é o c..., não pode acontecer isso. A gente preferiu se divertir. Foi difícil aceitar que isso é coisa legal. Muita gente falou que banda debutar era coisa baranga, que fazer aniversário de 15 anos era brega. Mas foi tudo muito legal.

No texto sobre o disco, você cita [o filósofo] Nietzsche. Você lê bastante?
Rogério Flausino –
O Nietzsche é muito doido. O Márcio [tecladista] lê muito mais. Não sou um super fã, mas já li algumas coisas. Eu comprei uma biografia nova dele, há 15 dias. Agora vou ler. Já comecei duas vezes, mas vou lendo e o cara é muito doido, cita vários malucos. Eu começo a ficar maluco. Eu tenho medo dele.

 O que você fazia quando tinha 25, no começo da banda, e não faz mais hoje de jeito nenhum, aos 40 anos?
Rogério Flausino –
O meu espírito continua o mesmo. Antes, virava muito a noite. Estou sentindo o peso da idade, não consigo quebrar tudo toda noite. Desde que minha filha nasceu há cinco anos eu abandonei um pouco as baladas, festas. Eu hoje dedico os momentos vagos para a minha filha. Ela é minha válvula de escape. Por causa dela estou no caminho do bem. Eu tinha uma ingenuidade, uma certa irresponsabilidade. Ainda não tinha tomado os chutes da vida. Quando você é jovem, você é mais autêntico. Você não pensa no que vão dizer. Você vai ficando velho e começa a dar ouvido a quem você não deveria dar. Já chegamos até aqui, agora quero me divertir. Não preciso mais pedir licença para os outros. A vida é curta para ficar nessa de “achomêtro”. Quero me entregar à vida.

Você costuma ler críticas sobre a banda, alguma já te deixou magoado?
Rogério Flausino –
Eu lido bem. No começo, a gente foi ingênuo. Não sabia que existiam regras. Quem constrói a história é quem está com o martelo na mão. Somos o que somos. Todo mundo está careca de saber quem a gente é. Sabem das nossas limitações e pontos positivos. Sou a favor de debatermos. Sou um cara bastante construtivo. Quero ajudar a nova geração a ganhar o grande público. Contem comigo. Não importa se gostam da nossa música, quero que gostem de mim: tenho muito a acrescentar. Não vamos convencer mais ninguém de que somos legais. Tenho 40 anos de idade, 15 anos de banda. Vamos continuar enchendo os lugares. Não estou comprando briga. Esqueçam um pouco isso, vamos elevar um pouco o nível...

 Ao reler entrevistas da banda nos lançamentos de discos anteriores, parece que existe um discurso de vocês que separa o Jota Quest pop do Jota Quest mais voltado para a black music, aquele som do começo de carreira. Existe isso?
Rogério Flausino –
Entre nós, existe um caos. Todos adoramos o funk, o black, o rock, a música eletrônica moderna.... Muitos momentos a gente se trai... Existe só um Jota Quest e ele é assim. Ele é pop. Todo mundo está louco para fazer pop no Brasil. Mas nem todos querem o sucesso. Existe meia dúzia de emburrados que dizem que não querem. Não existe nada pior do que ouvir um grupo em que as melodias são as mesmas. O cara não consegue costurar uma sequência de acordes. Qual a diferença de um rap bom e de um ruim? O bom consegue ir além da retórica, tem uma divisão assoviável! É a coisa do flow. Temos que fazer canções!

Várias bandas já fizeram propaganda: Skank de chinelo, Capital Inicial de cursinho de inglês, Seu Jorge de cachaça... Mas ninguém nunca foi tão achincalhado como vocês, por causa da Fanta Laranja. Vocês se arrependeram?
Rogério Flausino –
Eu poderia falar que é dor de cotovelo. Ganhamos uma puta grana na época. E era tabu fazer comercial. Mutantes fez para os postos Shell e ninguém falou nada. Nos anos 70 e 80, todos fizeram grandes contratos. O convite da Fanta foi sensacional. Por causa daquilo sempre tivemos patrocínio nos anos seguintes. A banda fica mais sólida e canta sobre o que acha justo. Naquele momento, o Jota Quest estava muito bombado, tínhamos vendido um milhão de cópias, estávamos superexpostos, o negócio foi ficando meio "over". "Fácil" e "O vento" tocaram muito. Quando saiu o comercial da Fanta, juntou a fome com a vontade de comer. A galera falou: "nossa, vamos arregaçar esses moleques". Juntaram seis caboclinhos em um restaurante para combinar. E aí nos detonaram [em reportagens na imprensa]. Foi um processo de achincalhamento geral.
 
Do que você não aceitaria fazer propaganda?
Rogério Flausino –
Ah, se fosse de uma cervejinha, faria. Eu não faria de cigarro e nem sei se pode. Não faria propaganda de macarrão, de extrato de tomate. Tem que ver para não ficar uma coisa forçada. Tem que ser legal, divertida, positiva.

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