Boa parte das resenhas que li dos shows do U2 em São Paulo apresentava uma lacuna gritante: falavam só da música e ignoravam o aparato visual do espetáculo.
É um pouco como resenhar Velozes e Furiosos e só analisar a história e as atuações.
Ignorar o telão do U2 significa ignorar a essência da turnê 360º, que é ser MULTIMÍDIA. Com esses shows, o U2 atingiu um novo e impressionante patamar no formato ao vivo que vem desenvolvendo há anos.
A Billboard Brasil acertou ao entrevistar Willie Williams, diretor de palco da banda desde 1982. Para se ter uma ideia de sua importância no esquema, ele é considerado o sexto membro da banda (o quinto é o empresário Paul McGuiness).
Nas conversas durante o show (eu fui no sábado, 9/4) comentar sobre o telão, em tons embasbacados, era obrigatório. Arrisco dizer que falou-se mais do telão do que da música.
E era mesmo algo de tirar o fôlego: tamanho gigantesco, definição de TV HD e imagens com textura de película cinematográfica. Efeitos, filtros e sobreposições com animações e grafismos invadem o vídeo em vários momentos. Daí, certa hora, ele se desmembra em dezenas de telas menores, virando algo que parecia uma gigantesca nave em forma de colmeia.
Assim:
O telão do U2 dá margem a algumas reflexões.
Uma delas foi levantada pela resenha que o Terra publicou do show: estávamos diante de uma representação da realidade que é muito mais atraente que a própria realidade.
Nada mais apropriado então, como bem notou a jornalista Carol Almeida, que o U2 começasse o show com “Even Better Than The Real Thing”. O telão do show, tradicionalmente um acessório para ajudar quem está longe do palco a ver melhor, virou uma atração por si só, “ainda melhor que a coisa real”.
Esse conceito amarra muito bem com uma banda que, desde o álbum Achtung Baby(91), vem brincando com temas interrelacionados como hiperrealidade, simulacro, pop art, preocupação com a imagem, a disseminação da tecnologia no dia-a-dia e o bombardeio midiático.
O show do U2 também está alinhado com o que quer o público nos dias de hoje.
O lançamento do iPad atrai mais interesse do que qualquer novo álbum de música. Mais gente se empolga com um app novo do iPhone do que com qualquer som que tenha chegado para “salvar o rock (ou o soul, ou a música eletrônica)”.
No baile da era digital, a música tem ficado sentada num canto enquanto todo mundo dá atenção para a tecnologia. Música hoje é só algo pra preencher nossos reluzentes players, não mais o território de sonho e fantasia que era décadas atrás.
São os ciclos da cultura pop. Há 50 anos, os astros do cinema deixaram de ser a realeza da cultura de massa, cedendo lugar às estrelas do rock. O pessoal da música segurou bem sua posição até que a fragmentação pós-moderna dos nichos e gostos começou a minar sua onipresença. Já no começo dos 90, se falava em fim do pop e em como nunca mais teríamos “um Michael Jackson”.
Nos últimos dez anos, o que se viu foi a tecnologia (games, softwares, apps, smartphones, gadgets) exercendo um fascínio muito maior que os melhores álbuns ou popstars conseguem.
Os artistas, que ficaram mal acostumados com a tecnologia, têm sua parcela de culpa. Moby, numa entrevista para a Wired, provoca na direção certa: “existe um monte de gente fazendo discos que são bem bons, mas não um monte de gente fazendo discos que são realmente excelentes. Esse é o lado ruim de software incrível. Você pode sentar com Reason ou Ableton e, literalmente, em algumas horas fazer um disco que soa muito bem. Muitas pessoas estão satisfeitas com isso, em vez de se empenhar em fazer algo que soa fantástico.”
O U2 não lança um álbum relevante (para quem não é fã, pelo menos) faz uns 15 anos. Mas os telões e a produção dos shows, esses só melhoram.
via bate estaca
Posted by Paulo Studio 2002
@ quinta-feira, 14 de abril de 2011
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