ECAD - Escritório que cobra por direitos autorais de músicos é investigado

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O órgão responsável pela distribuição dos direitos autorais artísticos no Brasil está em xeque.

Investigada pelo Senado e responsável pela gestão anual de mais de R$ 400 milhões, a cúpula do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição de direitos autorais (Ecad) corre o risco de ser indiciada por apropriação indébita, formação de quadrilha e cartel. Essa é a intenção dos cabeças da investigação e depende ainda de confirmação por parte do Ministério Público.

Pelo menos 14 pessoas estariam envolvidas em procedimentos que, de acordo com investigações dos senadores, resultaram em maquiagem das contas da instituição e distribuição duvidosa de bônus entre a sua diretoria.

O Ecad administra os pagamentos de direitos autorais sobre a execução de músicas e audiovisuais. Questionado pela forma de atuação, com cobrança sumária até mesmo em bailes de casamento e quermesses religiosas, agora se vê às voltas com uma contabilidade confusa – o que desagrada músicos. Em 2010, dos R$ 432,9 milhões, R$ 346,5 milhões foram pagos aos artistas, e uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que tramita no Senado investiga no que foi gasto o restante do dinheiro.

Conforme a CPI, em 2004 o Ecad decidiu incorporar ao seu caixa R$ 1.140.198 do chamado crédito retido – recursos de direito autoral arrecadados pelo órgão, mas que não haviam sido repassados por dificuldades na localização dos artistas. A manobra teria permitido à entidade transformar um déficit de cerca de R$ 700 mil em um superávit de R$ 444 mil, com pagamento aos diretores do Ecad de prêmios individuais de até R$ 50 mil.

Se investiga também casos mal explicados envolvendo o Ecad. Um deles: o bajeense Milton Coitinho dos Santos foi usado como laranja no pagamento de R$ 127,8 mil pela execução de trilhas sonoras de filmes de clássicos do cinema nacional – embora ele não seja músico, apenas motorista de ônibus. Coitinho jamais recebeu o dinheiro, que foi desviado para contas correntes de procuradores envolvidos com funcionários da União Brasileira de Compositores (UBC), a principal associação vinculada ao Ecad e que detém 45% dos votos da diretoria colegiada do órgão. Eles devem ser indiciados por falsidade ideológica e formação de quadrilha.

Podem ser também indiciados, mas por formação de cartel, oito diretores do Ecad e os seis presidentes das associações com direito a voto. Isso, por suspeita de que combinaram preços na cobrança pelas execuções musicais e se apropriaram de dinheiro de artistas.

De todo o valor arrecadado com pagamentos pela execução da música do artista, 25% são retidos pelo Ecad a título de taxa de administração (17,5% ficam com o Ecad e 7,5% com a associação na qual o compositor é credenciado). Os senadores querem a criação de um órgão de fiscalização do Ecad, hoje inexistente.
Casos mal explicados
 
A CPI relaciona casos que seriam exemplo de falta de controle no Ecad:
 
Compositor-fantasma
 
Um gaúcho que nunca compôs uma só canção consta, nos arquivos do Ecad, como beneficiário nominal de R$ 127,8 mil em direitos autorais de 24 trilhas sonoras do cinema nacional. Entre elas, dos filmes O Pagador de Promessas e Deus e o Diabo na Terra do Sol. Ele é Milton Coitinho dos Santos, um motorista de ônibus de Bagé. Ficou comprovado que ele nunca viu esse dinheiro:
 
– Se eu tivesse ganho essa bolada não estava aqui dirigindo ônibus, né? – reclamou.
 
O dinheiro seria repassado a um cunhado que trabalhava na União Brasileira de Compositores. Ambos foram indiciados por apropriação indébita e falsidade ideológica.
 
Falsos bailes
 
Em 2006, 14 pessoas de uma mesma família de São Paulo teriam tentado fraudar o sistema de distribuição do Ecad. No suposto golpe, a família mentia ao Ecad que havia promovido bailes de carnaval em que só tinham sido executadas músicas de sua própria autoria. Faturava milhares de reais em direitos autorais recolhidos. O caso provocou a demissão de 31 funcionários do escritório paulista, 17 por justa causa.
 
Sucesso jamais remunerado
 
Baixista do Legião Urbana até 1989, Renato Rocha, o Negreti, vive há cinco anos como morador de rua no Rio. Junto com Renato Russo, o músico compôs canções de sucesso como Daniel na Cova dos Leões. Ele diz que recebe poucos reais pelas músicas que fez para o Legião. O pai dele calcula que Negreti teria direito a R$ 110 mil por direitos autorais, apenas nos últimos 10 anos.
 
SAIBA MAIS
 
1. Ecad cobra de eventos e veículos de comunicação (canais de TV, emissoras de rádios etc.) um valor pela execução das músicas. O critério de cobrança considera a periodicidade da reprodução musical (se permanente ou eventual) e se a apresentação é feita por música mecânica ou ao vivo, com ou sem dança, e se existe algum tipo de receita (venda de ingressos, por exemplo). O valor a ser pago é calculado de acordo com estas informações.
 
2. O Ecad tem mecanismo para fiscalizar o que foi tocado. Para isso, conta com 840 fiscais. No Rio Grande do Sul, são 27 funcionários e mais seis agências no interior do Estado. Os fiscais utilizam, entre outros equipamentos, o Ecad.Tec Som (caixa lacrada, com um cartão de memória com autonomia para até 16 horas de gravação) e o Ecad.Tec CIA Rádio, sistema de captação dos fonogramas executados nas rádios brasileiras.
 
3. Depois de definido o valor da retribuição autoral, o usuário recebe um boleto de cobrança que deverá ser pago em qualquer agência bancária. O repasse do dinheiro é feito tendo como base o número de execuções, dividido entre artistas e produtores. Para receber, o artista deve ser filiado ao Ecad e registrar suas composições na entidade. Em 2010 foram beneficiados 92.650 autores, intérpretes, músicos, editoras musicais e gravadoras.
 
4. O Ecad engloba 10 associações de músicas. Só artistas filiados a essas associações podem receber da partilha. Até mesmo quando executam suas músicas os artistas têm de pagar ao Ecad.
 
 
Os músicos se pronunciam
 
Críticas
 
Depoimentos dados a ZH ou comissões de investigação do Ecad:
 
Carlos Leoni Rodrigues Siqueira Júnior, ou Leoni, ex-baixista e um dos principais compositores do grupo Kid Abelha
 
"As denúncias de fraude envolvendo o Ecad dão conta de que seu sistema é extremamente frágil, ineficiente e nada confiável, embora o órgão insista em dizer o contrário. Seus cadastros não têm uniformidade, não há critérios para desambiguação de obras homônimas, os registros são frouxos e não exigem nenhuma comprovação além da palavra de quem se declara autor. Fiz o levantamento no EcadNet de algumas obras famosas minhas da época do Kid Abelha como Lágrimas e Chuva, Educação Sentimental, Como Eu Quero e Fixação e em nenhum dos casos a banda era citada como intérprete. Dá para passar dias descobrindo furos estarrecedores."
 
Ivan Lins, compositor, músico e cantor de Música Popular Brasileira(MPB)
 
"Tenho certeza de que recebo menos do que deveria. E sou até um privilegiado, porque tenho quase 600 músicas gravadas, em 42 anos de carreira. Faço parte de uma elite de uns cem que mais recebem do Ecad no Brasil. Nem por isso deixo de criticar. O Ecad precisa ser fiscalizado. Não tenho controle do que recebo e porque recebo. Não sei, do me passam, quanto é oriundo de TV a cabo, de boate, de bares com música ao vivo... Nem sei se recebo por isso, é uma caixa-preta de direitos gerais difusos. Sei que recebo de shows que faço ou de cantores que interpretam minhas músicas.
 
Elogios
 
Depoimentos dados ao site do Ecad:
 
Elton Saldanha compositor gauchesco, autor de Eu sou do Sul, Castelhana e Canta Catarina)
 
"O Ecad faz o trabalho de pesquisar quem está veiculando música e recompensar o autor que vive disso. Quem está lá do outro lado faturando tem que pagar ao Ecad para que a gente possa receber. Nós não podemos ficar órfãos da sociedade, nós vivemos do direito autoral.
 
Fafá de Belém, cantora
 
"Há 37 anos eu canto, há 37 anos eu faço shows e recolho direito autoral. O Ecad luta para ser o melhor e faz do melhor possível para assim ser. Se as pessoas não pagam, como é que ele pode pagar ao autor?

Posted by Paulo Studio 2002 @ sábado, 7 de abril de 2012 0 comments

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